quarta-feira, junho 25, 2014

As páginas que ficam de fora...

Escrever sobre os desenhos que ficaram de fora do livro faz-me lembrar o Salon dos Recusados do séc. XIX. Fico sempre com a sensação que estas histórias não publicadas em papel poderiam ser tão ou mais interessantes do que as seleccionadas, mas é sempre assim, há que escolher...


Esta dupla página é exactamente assim no meu diário original, embora no livro esteja diferente. A porta de entrada para o moinho não ficou publicada, apenas fechada na prateleira aqui de casa. O Adama, esse sim ficou no livro. Não exactamente com esta importância, mas está lá. É só procurar bem...

Ele é o filho do moleiro e só me apercebi dele depois de três semanas a desenhar Marandallah. A razão é muito simples: o Adama estava sempre a trabalhar, sempre! O ambiente dentro do moinho era muito intenso e apetecível para desenhar. Aqui fica mais uma página do meu diário pessoal que não entrou no livro e respectiva transcrição do texto:


Mal se entra sente-se a atmosfera poeirenta no ar. Há um moinho para cada cereal: arroz, milho e mandioca. Assistir a toda a produção deu-me vontade de trabalhar ali durante uma temporada!
28.agosto.2013

O Adama também foi filmado pelo Yves Callewaert, para a campanha Getinspirit.

domingo, junho 08, 2014

Workshop: viagem em Lisboa


O meu próximo workshop de diários gráficos foi concebido a partir do filme Lisbon Story, de Wim Wenders. 
Vamos ver o filme repartido em quatro sessões de 25 min. e, a partir do que virmos, saímos para desenhar inspirados pela sensibilidade cinematográfica deste grande cineasta alemão sobre a nossa luminosa cidade de Lisboa.


O número de inscrições é limitado a 12 pessoas por causa da sala onde será visualizado o filme (Praça da Figueira).

ESGOTADO

Inscrições e mais informações para o meu email: linhares.mr@gmail.com

10% do valor da inscrição reverte para os Urban Sketchers Portugal

sábado, junho 07, 2014

Venezia: Piazza S. Marco

Mário Linhares, Veneza, abril de 2014

A Praça de São Marcos, em Veneza, deve ser uma das mais desenhadas e fotografadas do mundo...

Também eu não pude deixar de a tentar trazer no meu caderno com todo o seu espaço incrível.
Parece maior por termos de passar por tantas ruas estreitas e com pouca luz até chegar a este espaço aberto e único na cidade.
Enquanto a desenhava, também divagava: quantas pessoas não pisaram já este chão? Quantas histórias não terá ela para contar? Quando eu morrer ela vai continuar aqui para que outros a apreciem...
... não é fácil lidar com esta noção de finitude perante o que permanece depois de nós...

Ainda neste dia, absorvido pela minha pequenez perante a cidade, procurei livrarias para ler as reflexões de outros autores desenhadores sobre a Sereníssima. Encontrei por acaso este livro do John Ruskin:

Hewison, Robert, Ruskin a Venicia, Venice: La stamperia di venezia editrice, dicembre 1983

Sabia, antes de ler o livro, que o Ruskin tinha sido um intelectual inglês que escreveu e desenhou sobre vários assuntos, mas não sabia que a personalidade dele tinha sido tão inquietante. É muito intensa a experiência de ler e perceber a preocupação dele pelo registo de uma cidade que, para ele, estava em contínua decadência. Havia que desenhar antes que a ruína acontecesse por completo.

Um dos seus mestres era o William Turner, que tinha feito uma gravura da Praça de São Marcos duplamente polémica. Primeiro pelo título: Julieta e a sua enfermeira (criticado por ter escolhido Veneza em vez de Verona como cidade de fundo ao tema), segundo, pelo ponto de vista, que parecia demasiado alto para ter sido um desenho de observação.

Joseph Mallord William Turner, St. Mark's Place, Venice: Juliet and her Nurse

Curioso como se percebe a crítica do ponto de vista demasiado elevado mas, ainda assim, Ruskin, na primeira viagem que fez a Veneza (em 1835, com os pais e apenas 14 anos), das primeiras coisas que faz, é defender o seu mestre:

it is no such thing; it is a view taken from the roofs of the houses at the S.W. angle of St. Mark's place, having the lagoon on the right, and the column and church of St. Mark's in front. The view is accurate in every particular, even to the number of divisions in the Gothic of the Doge's palace.

Anos mais tarde, em 1843, quando aprofundou os seus estudos sobre o trabalho do Turner, acabou por mudar de opinião.

É sempre este o segredo: aprofundar os nossos conhecimentos sobre os assuntos que nos interessam para conseguirmos verdadeiramente tornar a informação em conhecimento e, depois, o conhecimento em sabedoria...